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Não comentes de boca cheia: um manual de boas práticas contra a normalização da “época medieval que se vive nas redes sociais”

De Viseu para o mundo, através do Instagram: 23 estudantes da licenciatura em Comunicação Social do Instituto Politécnico de Viseu aceitaram o desafio de criar conteúdos com bons conselhos sobre como estar online. Ao P3 referiram que, “tal como temos de ter boas maneiras à mesa, também devemos ter boas maneiras nas redes sociais, e tal como não se fala de boca cheia, também não se comenta de boca cheia”. O MILObs entrevistou Joana Rocha, uma das alunas por detrás dos vídeos que dão forma ao manual “Não comentes de boca cheia” e responsável pela comunicação do projeto – uma conversa sobre redes sociais realizada numa rede social.

 

MILObs: Como é referido na notícia do P3, o “Não comentes de boca cheia” surge no âmbito de uma unidade curricular da licenciatura em Comunicação Social do Instituto Politécnico de Viseu. Mas para além do desafio lançado pela docente Liliana Carona, de onde vêm as 23 recomendações que apresentam? Da vossa experiência online? Daquilo que têm estudado durante a licenciatura? Em suma, o que é que vos inspirou?

Joana Rocha: Os 23 pontos do nosso manual de boas maneiras nas redes sociais foram refletidos por todos os alunos envolvidos no projeto tendo em conta as nossas experiências nas redes sociais e o nosso conhecimento relativamente à violência online que está tão presente nos dias de hoje. Claro que nesta unidade curricular falámos bastante sobre determinados assuntos do digital e também nos levou a pensar e a dar ainda mais importância aos bons modos que devemos ter nas redes sociais.

 

Os alunos por detrás do Não comentes de boca cheia. Fotografia cedida por Joana Rocha

 

MILObs: Aos 23 pontos do “Não comentes de boca cheia” correspondem outros tantos vídeos no Instagram, que ilustram as vossas recomendações. Porque é que escolheram este formato e esta plataforma para divulgar e alojar o vosso projeto?

JR: Escolhemos este formato porque é nas redes sociais que se passa grande parte da violência online e por isso fazia todo sentido divulgar este manual através da rede social Instagram, uma vez que é uma plataforma utilizada por várias faixas etárias, não só os adolescentes.

MILObs: Como é que foi o processo de gravações dos vídeos? Tiveram algum tipo de cuidado em particular na produção? Por exemplo, procuraram “imitar” nestes vídeos o estilo dos conteúdos que vocês publicam informalmente nas redes sociais ou procuraram ter outro tipo de estética?

JR: Nós nunca procurámos imitar ninguém nem temos conhecimento que haja outra página do género em Portugal, foi uma ideia totalmente original e mesmo na criação dos vídeos tentámos fazer de uma forma humilde e simples. Claro que podíamos ter feito algo mais rebuscado, mas trabalhámos com os meios que temos disponíveis.

MILObs: Ponderam chegar a outros meios e usar outros formatos? Por onde veem o futuro do “Não comentes de boca cheia”?

JR: Sim! Eventualmente o TikTok mas, pelo facto de termos outras disciplinas e outras ocupações, neste momento o Instagram é realmente a página primordial. Reparamos que tanto os jovens como pessoas com uma faixa etária de 40, 50 e até 60 anos estão no Instagram por isso achamos que é a rede que abrange mais pessoas.

MILObs: Qual é o público-alvo do “Não comentes de boca cheia”?

JR: O público alvo é sobretudo o público jovem, mas claro que qualquer pessoa pode e deve ter interesse nesta matéria. A violência online afeta muitas pessoas, mas principalmente mulheres e de qualquer idade. Vemos figuras públicas, de uma forma transversal a qualquer faixa etária, serem achincalhadas nas redes. A Madonna recentemente apelou a que não lhe fizessem bullying. E, por exemplo, um dos pontos do nosso manual apela a que apoiemos infoexcluídos que não sabem “mexer” com as redes sociais, como alguns utilizadores mais velhos.

MILObs: Entretanto já levaram o projeto até (pelo menos) à Escola Profissional de Moimenta da Beira. Levar o “Não comentes de boca cheia” para lá do Instituto Politécnico de Viseu é um dos vossos objetivos? Até onde gostavam de chegar e que passos têm dado nesse sentido?  

JR: Levar o “Não comentes de boca cheia” para la do Instituto Politécnico de Viseu é sem dúvida um dos nossos objetivos! Adorámos ter a experiência de poder apresentar o Manual numa escola e ter este contacto direto com os jovens! Importante realçar que estivemos em Condeixa a Nova no dia 29 de novembro no Festival Género ao Centro! Ao longo deste processo temos dedicado um pouco do nosso tempo a publicar conteúdos diversificados no nosso Instagram, a fazer várias pesquisas sobre esta matéria com a esperança de o nosso manual ainda chegar mais longe do que já chegou. A paz distribuiu-se e propaga-se. É preciso é fazer alguma coisa. Não podemos continuar de braços cruzados a normalizar esta época medieval que se vive nas redes sociais.

MILObs: Já têm feedback da receção ao manual? Por exemplo, qual é a perceção que têm da receção deste projeto no Instituto Politécnico de Viseu? 

JR: Sim, temos tido muita receção, sobretudo do exterior mas também interior, como por exemplo a professora Joana Martins da ESEV, que tem partilhado muito a nossa página, e outros professores também nos deram os parabéns e creio que para a instituição é muito importante, não me recordo que a ESEV tenha tido um projeto a nível de dinamização na área da Comunicação Social nos media como este. Olhando ao jornalismo local e regional, esse foi o nosso primeiro palco. A imprensa regional do centro de Viseu é bastante atenta ao que faz o Instituto Politécnico de Viseu e, neste sentido, depois de aparecer na imprensa regional catapultou para outros órgãos de comunicação, mas mais uma vez agradecemos o apoio da imprensa e sobretudo da imprensa regional/local que divulga todos os nossos trabalhos.

MILObs: No MILObs acolhemos um projeto direcionado a jovens um pouco mais novos do que vocês (com não mais de 18 anos), em que os incentivamos a fazerem ouvir a sua voz através dos media: na campanha Expressa-te, do projeto bYou. Para além da adoção de boas maneiras também online, que conselhos podem deixar a quem pretender fazer aquilo que vocês fizeram: expressar um conjunto de ideias através dos media?

JR: Relativamente às camadas mais jovens e até porque vemos pelas últimas notícias, aquilo que parece ser a maior preocupação é o captar de imagens, terem atenção quando captam e enviam imagens ou vídeos para não mostrarem traços da sua fisionomia, do aspeto e do lugar onde estão. Creio que isso é realmente o perigo entre as camadas mais jovens porque ainda não estão sensibilizados para essa matéria. Não se pode dizer unicamente assim: “Não partilhes”, “não faças”, porque no que diz respeito aos mais jovens, o discurso tem que ir um pouco mais além.